por Deborah Portilho
Revista UPpharma nº 172- ano 41, Mar/Abr 2018, p.44-45
Em 16.01.2018, a ANVISA noticiou em seu site a publicação da Orientação de Serviço nº 43, de 22.12.2017, a qual dispõe sobre o detalhamento da RDC (Resolução da Diretoria Colegiada) nº 59/2014. Esta RDC é a primeira resolução da ANVISA inteiramente dedicada aos nomes/marcas de medicamentos, e a Orientação de Serviço recentemente publicada estabelece critérios complementares para a avaliação e decisão sobre os nomes/marcas pela ANVISA, de modo que o registro dos respectivos medicamentos possa ser concedido por aquela Agência.
Nesse sentido, cabe salientar que, apesar de o INPI ser o órgão responsável pelo registro de marcas, o registro sanitário – necessário para a comercialização dos medicamentos – só é concedido pela Agência Sanitária após a análise e aceitação do nome/marca proposto pelo titular (independentemente de registro no INPI). Assim sendo, na prática, para que determinado medicamento possa ser comercializado com uma dada marca, é necessário que aquela marca seja literalmente aprovada pela ANVISA, mais precisamente por sua Gerência Geral de Medicamentos e Produtos Biológicos (GGMED).
Observe-se que a proibição de registro de medicamentos com nomes semelhantes já era prevista desde 1976, na Lei nº 6.360/76 (ainda em vigor). Com a criação da ANVISA em 1999, a atribuição relativa a essa análise passou a ser de sua responsabilidade e vem sendo feita, pelo menos desde 2003, quando ela publicou sua primeira resolução sobre rotulagem de medicamentos (RDC nº 333/2003), a qual estabeleceu os primeiros critérios para análise de colidência gráfica e fonética (o chamado “critério das três letras”).
Desde então, em vista da necessidade de critérios adicionais para determinar a colidência de marcas, a Agência tem revisto essa questão, inclusive por meio de Consultas Públicas, com o propósito de adotar normas e critérios mais adequados, o que resultou na implementação da RDC nº 59/2014. Entretanto, foi principalmente a partir de 2016 que a GGMED passou a fazer exigências técnicas, com base na citada RDC, requerendo a alteração de marcas (por vezes já registradas junto ao INPI), gerando, dessa forma, problemas para as empresas, particularmente atrasos nos registros e, consequentemente, na comercialização dos medicamentos.
Assim, em vista da necessidade de maior clareza em relação às análises da GGMED para a aceitação das marcas de medicamentos, a ANVISA publicou a citada Orientação de Serviço, a qual apresenta, em seu art. 3º, uma lista dos procedimentos que são/devem ser seguidos pelos técnicos da Agência. Essa lista enumera, em primeiro lugar, as pesquisas que devem ser realizadas, a saber:
I. pesquisa realizada no sistema POCA(1);
II. pesquisa em bancos de dados de medicamentos (Datavisa);
III. pesquisa na base de dados do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) para fins de verificação de submissão/registro de marca;
Em seguida, o artigo enumera os três tipos de avaliação que devem ser feitas, quais sejam:
IV. avaliação da colidência gráfica e fonética (2);
V. avaliação dos potencias erros; e
VI. avaliação da segurança do nome proposto, fundamentado nos seguintes pressupostos de risco quanto ao erro na:
a) prescrição;
b) dispensação; e
c) administração ou uso.
São muitos os comentários que poderiam ser feitos em relação a cada um desses itens, bem como aos artigos e itens subsequentes. Contudo, nesta oportunidade, iremos nos ater apenas a algumas questões que tangenciam o Direito Marcário.
Com relação à colidência gráfica e fonética mencionada no art. 3º, IV, acima, cabe observar que a Orientação prevê em seu art. 4º, § 1º, que a avaliação deve ter como base a língua oficial do Brasil. Isso significa que a possibilidade de colidência fonética deverá ser avaliada pelos técnicos pela forma como a marca é escrita e pronunciada em português. Porém, com exceção deste critério específico, não foi estabelecido qualquer outro a ser seguido de forma concreta. Desse modo, os resultados das análises conduzidas pelos técnicos acabarão sendo essencialmente subjetivas.
Também é digno de nota o art. 6º, o qual prevê que, quando for identificada [pela ANVISA] colidência gráfica e fonética entre o nome/marca proposto e o nome de outro medicamento já registrado na ANVISA, a GGMED poderá exarar exigência técnica para que a empresa realize a avaliação de colidência. Cumprida a exigência, ou seja, feita a avaliação da colidência pela empresa, a GGMED deverá então promover sua análise para avaliação do nome proposto. Se o nome for reprovado, a GGMED deverá enviar à empresa, por ofício eletrônico, a motivação da reprovação. Contudo, a Orientação não menciona a possibilidade de recurso em caso de reprovação do nome. Por outro lado, o documento deixa claro que, apenas após a avaliação integral da primeira proposta de nome e subsequente envio da motivação da reprovação à empresa é que a GGMED iniciará a avaliação do nome/marca alternativo apresentado na petição.
Por fim, vale mencionar que a Orientação prevê que a GGMED deverá elaborar uma matriz de risco para avaliação do nome quanto à possibilidade de erro ou confusão na prescrição, na dispensação, na administração e/ou uso do medicamento, a qual já está disponibilizada no portal da ANVISA. Tal matriz tem como finalidade padronizar e subsidiar as decisões dos técnicos da GGMED sempre que for identificada colidência gráfica e fonética aliada à semelhança entre as características intrínsecas do medicamento.
Bem, essa foi apenas uma breve análise da Orientação de Serviço nº 43/2017, para tratar de algumas de suas disposições relacionadas especificamente à colidência de marcas. Esperamos que ela seja apenas a primeira de uma série de Orientações que a ANVISA precisa publicar até que as empresas possam literalmente orientar suas áreas Regulatória e Jurídica quanto à criação de nomes/marcas de medicamentos, passíveis de serem não apenas registrados no INPI, mas, principalmente, aprovados pela GGMED.
Notas:
(1) POCA (Phonetic and Orthographic Computer Analysis) é o nome do sistema utilizado pelo FDA (U. S. Food and Drug Administration), projetado para auxiliar na identificação de possíveis conflitos fonéticos e ortográficos.
(2) Apesar de a Orientação Nº 43/2017 mencionar “distinção gráfica e fonética”, entendemos que o correto seja “gráfica e/ou fonética”.
©Deborah Portilho* – fevereiro de 2018