por Deborah Portilho
Jornal Valor Econômico, Caderno Legislação e Tributos, Rio, 27.05.2004
Sabe-se que grande parte das palavras existentes nos idiomas ocidentais já foi adotada como marcas. Portanto, não é de se surpreender que empresas nacionais e estrangeiras, de fabricantes de biscoito a laboratórios farmacêuticos, tenham dificuldades para encontrar palavras disponíveis e mesmo para cunhar novas palavras que possam servir de marcas para seus produtos e serviços. A situação é paradoxal: enquanto existe uma escassez de possibilidades para novas marcas, há uma abundância de marcas devidamente registradas no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) que simplesmente não são usadas por seus titulares.
Uma das razões que contribuem para essa realidade é que, antes de lançar um novo produto, algumas empresas – principalmente as estrangeiras – depositam várias marcas, na esperança de que pelo menos uma seja registrada pelo INPI. Enquanto apenas uma dessas marcas é usada para identificar o produto, as demais são mantidas para um possível uso futuro, o qual nem sempre ocorre.
Outro fator que contribui para a existência de milhares de marcas registradas no INPI e que não são utilizadas é que, no Brasil, não é necessário que se prove o uso da marca para que o respectivo registro seja prorrogado pelo instituto. Ou seja, mesmo quando uma marca não é usada, seu titular pode requerer a prorrogação do registro correspondente, mantendo-a na base de dados do INPI pelos próximos dez anos, até que o registro seja novamente prorrogado ou então se decida abandoná-la.
Muito provavelmente por esses motivos – e pela dificuldade de se criar marcas novas -, tem-se notado uma tendência das empresas nacionais em procurar marcas para seus produtos e serviços dentre aquelas que já estão registradas no INPI. Essas empresas escolhem marcas que já foram abandonadas por seus titulares e cujos registros já foram declarados extintos pelo instituto ou apresentam pedidos de declaração de caducidade contra os registros que acobertam marcas ainda vivas que sejam de seu interesse.
É importante notar que, independentemente de a empresa requerer a caducidade de um determinado registro ou adotar uma marca cujo registro já esteja extinto, ela terá, necessariamente, que depositar um pedido de registro para a marca escolhida, o que significa uma espera mínima de quatro anos.
Tem-se notado uma tendência das empresas nacionais em procurar marcas dentre aquelas já registradas no INPI
Ao mesmo tempo, existem empresas que, todos os anos, abandonam dúzias de marcas registradas que não são mais de seu interesse. Ao agir desta maneira, perdem todo o investimento feito com os depósitos destas marcas e com a manutenção de seus registros, muitas vezes prorrogados por várias décadas.
Em suma, de um lado existem empresas perdendo dinheiro com o abandono de marcas registradas que não são mais de seu interesse. Do outro, há empresas gastando tempo e dinheiro com o depósito e registro de marcas extintas ou abandonadas. Não seria muito melhor se, em vez de perder, ambas as partes pudessem lucrar com essa situação?
Obviamente, a resposta é afirmativa. E a solução é muito simples. Ao invés de abandonar marcas que não são mais de interesse, seus titulares poderiam colocá-las à venda em um site especializado em compra e venda de marcas. Se ela fosse vendida, a transferência do respectivo registro seria feita para a parte interessada. Caso contrário, seu titular simplesmente a abandonaria à época da prorrogação.
O aspecto mais importante dessa situação é que não há qualquer desvantagem ou prejuízo para as partes envolvidas – apenas vantagens e lucros -, não importando por qual ângulo a questão seja vista ou analisada.
É por isso que a bandeira da reciclagem de marcas deve ser levantada. Trata-se de uma iniciativa totalmente factível e igualmente benéfica para todas as partes envolvidas na negociação e que pode ser adotada em todo e qualquer segmento de mercado.